terça-feira, 12 de julho de 2011

Um persistente cio


"Ah, a tristeza de saber, no fim da leitura de certos livros, que nunca mais os leremos pela primeira vez, que não se repetirá jamais a sensação da primeira leitura..."

É muito interessante observar o quanto a ditadura da velocidade e do "não tenho tempo a perder" retira do cotidiano das metrópoles (e de suas tristes simulações) uma das mais profundas maneiras de aproveitar, de fato, o tempo: a necessária paciência para a fruição, quase degustação lenta, dos movimentos de busca intensa do prazer originário do universo da leitura. Essa insana tacocracia, vivida sem reflexão, produz uma amarga rejeição à eroticidade inerente aos momentos nos quais é preciso entrar no cio emanado da leitura prazerosa, do mergulho intencional e povoadamente solitário que nos atinge quando nos abandonamos aos sussurros que vêm de dentro.Por isso, ao escrever "A Arte de Amar" (nela incluída a capacidade de não admitir a banalização do erótico no sexual), o psicanalista alemão Eric Fromm — nas suas geniais tentativas de juntar as concepções de Marx e Freud, que tanto influenciaram a contracultura dos anos 1970 — nos advertiu de que "o homem moderno pensa perder algo — tempo — quando não faz as coisas depressa; entretanto não sabe o que fazer com o tempo que ganha, a não ser matá-lo".Há frase mais tola do que a daquele ou daquela que diz "acho que, para passar (ou matar) o tempo, vou ler alguma coisa"? Ler um livro para matar o tempo? Não! Afonso Arinos de Melo Franco, importante jurista e político mineiro, mais conhecido por ser autor da primeira lei, em 1951, contra a discriminação racial, mas que também era escritor (ingressou na Academia Brasileira de Letras em 1958, mesmo ano em que foi eleito senador), escreveu em "A Escalada" que "domar o tempo não é matá-lo, é vivê-lo".Viver o tempo! Vivificá-lo, torná-lo substantivo e desfrutável. Ora, nada como um bom livro para fazer pulsar a vida no nosso interior, vida essa que, quando absortos na leitura, nos faz esquecer a fluidez temporal e nos permite suspender provisoriamente a mortalidade e a finitude. É um pouco a percepção que teve o russo Turgueniev dos principais escritores do século 19; na inquietante obra "Pais e Filhos", escreveu: "O tempo, que frequentemente voa como um pássaro, arrasta-se outras vezes que nem uma tartaruga; mas nunca parece tão agradável como quando não sabemos se ele anda rápido ou devagar".Mas o que é um bom livro? A subjetividade da resposta é evidente. No entanto é possível estabelecer um critério: um bom livro é aquele que emociona você, isto é, aquele que produz sentimentos vitais, que gera perturbações, que comove, abala ou impressiona. Em outras palavras, um bom livro é aquele que, de algum maneira, afeta você e o impede que passe adiante incólume.A emoção do bom livro é tão imensa que se torna, lamentavelmente, irrepetível. Álvaro Lins, crítico literário pernambucano que chegou a chefiar a Casa Civil do governo JK, fez uma reflexão no "Notas de um Diário de Crítica" que expressa uma parte dessa contraditória agonia: "Ah, a tristeza de saber, no fim da leitura de certos livros, que nunca mais os leremos pela primeira vez, que não se repetirá jamais a sensação da primeira leitura, que não teremos renovada a felicidade de ignorá-los num dia e conhecê-los no dia seguinte".Certa vez, o grande linguista e pensador brasileiro Flávio Di Giorgi perguntou a um aluno, em um sarau na PUC-SP, se ele já houvera lido a "Odisséia", de Homero; o jovem, cabeça baixa, um pouco envergonhado, disse que não. Imediatamente, o professor, olhos umedecidos, disse a ele, voz embargada e com a sinceridade de sempre: "Eu o invejo; eu já a li".Assim — mesmo que quase tudo hoje em dia dificulte a urgência de vivificar com uma boa leitura, especialmente a estafa resultante do desequilíbrio e da correria incessante —, muitos não se deixam humilhar pelos assassinos do tempo; para impedir a vitória da mediocridade espiritual, há os que cantam com Djavan — na belíssima "Faltando um Pedaço" — e sabem que "o cio vence o cansaço".


domingo, 24 de abril de 2011

Gaiolas e Asas


 
Escolas que são gaiolas existem para que os pássaros desaprendam a arte do vôo. Pássaros engaiolados são pássaros sob controle. Engaiolados, o seu dono pode levá-los para onde quiser. Pássaros engaiolados sempre têm um dono. Deixaram de ser pássaros. Porque a essência dos pássaros é o vôo.

Escolas que são asas não amam pássaros engaiolados. O que elas amam são pássaros em vôo. Existem para dar aos pássaros coragem para voar. Ensinar o vôo, isso elas não podem fazer, porque o vôo já nasce dentro dos pássaros. O vôo não pode ser ensinado. Só pode ser encorajado.

domingo, 10 de abril de 2011

Mundinho Pequeno


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Se pudéssemos reduzir a população do mundo a um vilarejo de 100 pessoas, mantendo todas as proporções atuais, o resultado seria o seguinte:

57 asiáticos
21 europeus
14 do hemisfério ocidental (Américas)
8 africanos

52 mulheres
48 homens

70 não-brancos (amarelos, vermelhos ou negros)
30 brancos

70 não-católicos
30 católicos

59% de toda a riqueza seria de 6 pessoas, e todas as 6 seriam dos Estados Unidos
41% da riqueza seria distribuída por 94 pessoas

80 morariam em casas abaixo do desejável
20 morariam em casas boas e ótimas

70 seriam analfabetos
30 alfabetizados

50 seriam desnutridos
50 nutridos

1 (sim, só um) teria nível superior
99 não teriam nível superior

1 teria um computador
99 não teriam computador

Quando se considera o mundo de uma perspectiva tão comprimida a necessidade de aceitação, compreensão e educação se torna absurdamente aparente, não?

domingo, 27 de março de 2011

Aprendizagem: construção em etapas


            Quando pensamos em construir uma casa ou qualquer outro tipo de obra, notamos que essa construção passará por várias etapas, tais como: compra de terreno, projetos, escolha e compra de material de construção, contratação de mão – de – obra, fiscalização e documentação.
            Com a aprendizagem não é diferente, pois esta também não é adquirida ou construída de uma só vez. É perfeitamente possível planejar para que essa aprendizagem seja construída significativamente e possa vir a progredir a partir de uma base, sem perder sua funcionalidade.
            Nossa maior preocupação, nos dias atuais, é garantir que cada etapa de construção da aprendizagem de nossas crianças não pareça inacabada e que, o construído e adquirido por ela posteriormente, não seja entendido como um anexo apenas. Afinal, nossas crianças precisam desfrutar de cada etapa dessa construção para, assim, avançarem em suas hipóteses.
            Esse processo de construção da aprendizagem é trabalhoso, mas sua recompensa é alta, principalmente se a criança a estiver construindo para si e com os outros.
            Assim como ao construir uma casa respeitamos e desfrutamos de cada etapa a ser concluída e, ao longo do tempo, pensamos em expansão, o mesmo deve acontecer com a criança nesse processo de aprendizagem, ou seja, devemos criar e projetar em nossas crianças possibilidades de expansão, sempre respeitando os seus limites e suas particularidades. Assim,  o fim desse processo marcará o início de uma nova etapa: a construção de um novo mundo.



Isabel Cristina de Brito
Professora da EMEF “Antônio Duarte Nogueira”

terça-feira, 22 de março de 2011

Processo educativo e diversidade cultural: desafio da gestão escolar democrática contemporânea.

 

A escola deve ser concebida como um espaço que possibilita o contato e a inter-relação entre os diversos grupos sociais que compõem nossa sociedade, pois as atuais sociedades são marcadas por diversidades de natureza social, de gênero, religiosa, étnico-racial, necessidades especiais, escolha cultural, sexual e outras. As salas de aula constituem espaços privilegiados para abordar as diferenças, não para isolar grupos, ou para aumentar a fragmentação que se pretende neutralizar, mas sim, como contribuição para o questionamento de valores, preconceitos e visão de mundo de cada um.
A educação escolar deve propiciar o reconhecimento destas diferentes identidades, pois cada um desses grupos possui sua própria herança cultural, repleta de significados e valores. O diferente precisa ser visto como fonte de trocas e como elementos positivos para a renovação das culturas.
A escola, como um todo, deve favorecer um diálogo que permita a separação das divergências que costumam, em muitos casos, impedir a integração entre os diferentes. Trata-se, pois, de estratégias de diálogos e de trocas, onde os diversos grupos possam participar como sujeitos e produtores de cultura.
Este tema convida-nos a repensar sobre como nós, educadores, podemos fazer da sala de aula um espaço para lidar com as diferenças, de modo a promover novas atividades de cooperação e interação.

Marli Ap. Sponchiado Capoleti
Diretora da EMEF “Dr. Antônio Duarte Nogueira”